Violência política de gênero
A violência política de gênero refere-se a atos físicos, sexuais, psicológicos ou simbólicos de agressão, ameaça, assédio ou intimidação cometidos contra mulheres (cis ou trans) com o objetivo de impedir, restringir ou anular o exercício de seus direitos políticos e funções públicas.
Definição
Não se trata apenas de "jogo sujo" eleitoral comum. É uma violência direcionada à condição de ser mulher. Ocorre quando a candidata ou eleita é atacada não por suas ideias, mas por seu gênero, corpo, sexualidade ou vida privada. No Brasil, este conceito ganhou força jurídica com a sanção da Lei nº 14.192/2021, que criminalizou essa prática. A violência política de gênero é uma ferramenta de manutenção do patriarcado: ela serve para enviar uma mensagem pedagógica de que o espaço público e de poder "não é lugar de mulher", tentando empurrá-las de volta para a esfera doméstica.
Como funciona
Funciona através de um espectro de agressões que vai do silenciamento ao feminicídio político. Simbólica/Psicológica: interrupções constantes em falas (manterrupting), explicações condescendentes (mansplaining), questionamento da sanidade mental ("histérica", "louca"), e difamação baseada na moral sexual (chamá-la de "puta" ou questionar a paternidade dos filhos). Institucional: partidos que negam verbas de campanha para mulheres (ou as usam como "laranjas"), recusa em indicar mulheres para comissões importantes ou falta de banheiros e estruturas de apoio à maternidade nos parlamentos. Virtual: ataques coordenados de ódio (hate speech), ameaças de estupro em e-mails institucionais e criação de deepfakes pornográficos para destruir a reputação da candidata.
Exemplos
- O Caso Marielle Franco: o assassinato da vereadora em 2018 é o exemplo extremo de violência política de gênero interseccional (mulher, negra, favelada, LGBT), visando eliminar fisicamente uma liderança em ascensão.
- Misoginia contra Dilma Rousseff: durante o processo de impeachment, adesivos pornográficos com a imagem da presidente foram colados em carros, e as críticas focavam em chamá-la de "dura", "feia" ou "desequilibrada", adjetivos raramente usados contra homens corruptos.
- Ameaças a parlamentares Trans: a perseguição sistemática a parlamentares como Erika Hilton, Benny Briolly e Duda Salabert, que recebem ameaças de morte constantes e ofensas transfóbicas dentro das casas legislativas, sendo obrigadas muitas vezes a andar com escolta armada ou sair do país.
- Ameaças à família: ameaçar os filhos das candidatas para forçá-las a renunciar, explorando o papel social de "mãe protetora".
Quem é afetado
Afeta mulheres que ousam ocupar espaços de poder, sejam candidatas, eleitas, ativistas ou defensoras de direitos humanos. No entanto, a violência é agravada pela interseccionalidade: mulheres Negras, Indígenas (como a ministra Sonia Guajajara e a deputada Célia Xakriabá), LBTQIA+ e de periferia sofrem ataques mais virulentos e físicos do que mulheres brancas de elite, pois seus corpos são vistos como duplamente invasores naquele espaço (por gênero e por raça/classe).
Por que é invisível
É invisível porque é normalizada como "o preço da política". A sociedade tende a ver a política como um ambiente hostil e masculino por natureza, sugerindo que mulheres que entram nele "devem aguentar a pressão". Quando uma mulher reage à violência, ela é frequentemente rotulada de "emocional" ou "vitimista". Além disso, os próprios partidos políticos muitas vezes acobertam os agressores para evitar escândalos.
Efeitos
O principal efeito é o desencorajamento. Mulheres desistem de se candidatar ou abandonam a política precocemente para preservar sua saúde mental e física e a segurança de suas famílias. Isso gera um déficit democrático grave: embora as mulheres sejam mais de 50% da população brasileira, ocupam menos de 18% das cadeiras no Congresso, perpetuando leis e orçamentos feitos sob a ótica masculina.
Autores brasileiros
- Flávia Biroli
- Marlise Matos
- Instituto Marielle Franco
- Instituto AzMina
Autores estrangeiros
- Mona Lena Krook
- Rita Segato
